
Ylana
abriu a porta e vislumbrou a brancura gelada, que se estendia até onde
seus olhos alcançavam. Respirou fundo. Sentiu os açoites do frio e do
vento gélidos, atravessarem seu corpo, como alfinetes espetados
bruscamente em uma almofada.
Afogada
pela claridade da paisagem, desviou a atenção para o homem deitado no
sofá em frente à lareira. Dimitri. Uma ebulição de pensamentos
ferveu-lhe o cérebro, ao recordar os últimos acontecimentos. Cruzou os
braços rente ao corpo, em busca de algum calor e conforto.
“Por que alguns são mais fortes e outros são mais fracos?”
* * *
Conheceu
Dimitri em uma galeria de arte em São Paulo. Hipnotizada por uma tela
impressionista, perdeu-se em pensamentos longínquos.
Distraída,
inclinou-se levemente para conferir o folheto da exposição e ao erguer
os olhos deparou-se com ele. Apaixonou-se. E o quis. Simples assim.
Ylana
sempre conseguia o que queria. E conseguiu. Cativou Dimitri com seus
inúmeros encantos. Depois daquele dia, não se desgrudaram mais.
Quando ele a convidou para conhecer a família que morava distante, Ylana ficou radiante e aceitou prontamente.
Tão logo soube o destino, pulou de alegria. “Sibéria?! Ah, sim, vamos!”
Com ele, iria ao inferno, se preciso fosse.
“E que ele jamais saiba que o inferno sou eu” - rogou a si mesma.
“E que ele jamais saiba que o inferno sou eu” - rogou a si mesma.
Pela
primeira vez Ylana sentia algo bonito por alguém. Mais do que uma
necessidade, seu sentimento por Dimitri se intensificava, enchendo-a de
esperanças.
“Quem sabe, esse amor me salve desse castigo a que estou condenada” - pediu Ylana em seus pensamentos.
* * *
Uma semana depois de chegarem, as coisas começaram a sair dos eixos.
Devidamente
instalados em uma confortável pousada, Ylana convenceu Dimitri a
aguardarem mais uns dias, pois o clima a golpeara de tal forma, que não
se via pronta para o encontro com a família dele.
O oceano branco, além de afetar seu estado de espírito, atingira também seu metabolismo. Inchou e ficou roliça como uma foca.
Tinha receio de sair, escorregar na neve e rolar em avalanche, indo parar numa toca de marmotas.
Sua
aparência estava grotesca. Antes, eufórica pela aventura romântica do
passeio, agora, absurdamente incomodada. Em hipótese alguma aceitaria
ser vista naquele estado lastimável. Queria causar a melhor impressão
possível.
Dimitri achava graça e tentava tranquilizá-la de todas as formas. Sem sucesso.
—
Ei, você está linda! Com tantas roupas, eu mal consigo ver seu corpo
direito. Meus pais não perceberão nada. Relaxa, amor.
— Linda? Pois eu me sinto horrível! – retrucava Ylana.
A
reação despreocupada de Dimitri, diante daquela situação insólita,
encheram-na de preocupação. Estava conhecendo um outro Dimitri,
sarcástico e zombeteiro. E isso não lhe parecia nada bom.
“Não! Não faça pouco caso de mim. Ele pode acordar....e eu não serei mais dona de meus atos” - implorou Ylana, internamente.
Para seu desespero, continuou inchando, dia após dia.
Alheio ao perigo, Dimitri rolava de rir daquilo tudo.
Por
sua vez, Ylana não era mais a mesma. Seu entusiasmo congelara. E todos
os sintomas se pronunciavam contundentes, numa sequência de fatos que
não mais conseguiria interromper.
Uma
vez desencadeado o monstro da jaula, nada poderia ser feito para
impedi-lo de agir. Só um milagre!... Mas Ylana não acreditava mais em
milagres.
No
correr do tempo, sensações boas e ruins se debatiam dentro dela. E os
remédios nessas horas não surtiam mais efeito. O pior acontecera.
Olhou novamente para o corpo inerte sobre o sofá.
Não estava mais no controle. O sangue em suas mãos eram prova disso.
Teria
sido diferente, se Dimitri soubesse dizer a coisa certa, na hora certa.
Mas não!... Estragara tudo! Ele era o culpado por não saber lidar com
os instintos mundanos que dormiam nela. Novamente o fato se repetira.
Pela quarta vez vira soltar-se da jaula, a fera de garras afiadas, cujos
remédios mantinham sob inofensiva calma. Uma palavra errada. Um gesto
equivocado. Um olhar acusador. Uma atitude suspeita. Um comentário
sarcástico. Um sorriso cínico. E pronto! O cadeado se rompia. E o alívio
só viria quando o autor da afronta fosse eliminado.
Antes
da tragédia acontecer, tentara avisar Dimitri, pois não queria
assustá-lo e nem feri-lo. Porém, ao invés de compreensão, ganhara uma
risada irônica como resposta e frases do tipo "todos temos nossos
monstros, escondidos em labirintos escuros.”
— Diz isso porque não sabe do que Self é capaz – alertou, assustada.
— Self? Quer dizer que seu bicho papão de estimação tem nome? – debochou ele, rindo alto.
Enquanto
Dimitri gargalhava, Ylana pode sentir o cadeado sendo forçado e bem
perto de ser rompido. Self escutara! Devia estar enfurecido com aquela
provocação. O tratamento, as internações, os remédios para mantê-lo
inofensivo nunca eram o suficiente. Nunca!
Quando
algo assim acontecia, ela utilizava a técnica aprendida com seu antigo
terapeuta - contar de um a cem - e de cem a duzentos, em casos
extremos. Enquanto contava, sua respiração se normalizava, empurrando-o
de volta para o fundo.
Mas
Self era muito esperto e conhecia o truque de contagem de Ylana. Com
sua força redobrada pela fúria, sacudiu a jaula, batendo o cadeado
contra as vértebras de Ylana e com mãos vorazes abriu a cela e escalou
velozmente até a saída.
Uma vez solto, nada o impediria de silenciar o inimigo: Dimitri.
Indiferente
ao terror interno que Ylana vivia, Dimitri, com seu jeito calmo e
alegre, continuava rindo, sem acreditar em nada do que ela lhe contava.
E
foi num momento de descuido, que a faca ganhou terreno, perfurando-o no
instante exato em que tentara pegar uma xícara de café. Atacado de
surpresa, cambaleou. Recuou alguns passos, com as mãos no peito e
desabou no sofá.
Ylana
afastou-se. Olhou atônita para o corpo sem vida. Abriu a porta,
ainda com a faca nas mãos, assimilando lentamente o que acontecera.
Self
acompanhara de perto. Assim como ocorrera das outras vezes, resolveria
tudo e não deixaria vestígios incriminadores para ambos.
No entanto, dessa vez algo diferente precisaria ser feito. Ylana deixara de ser uma boa hospedeira.
Em choque, ao ver o corpo de Dimitri, demorou para voltar à realidade.
O telefone tocava insistentemente. “Serão os pais de Dimitri?”
O telefone tocava insistentemente. “Serão os pais de Dimitri?”
Ao
girar o corpo para atender a ligação, Ylana recebeu o primeiro golpe.
Tombou sobre o tapete da sala. Um filete de sangue escorreu de sua nuca.
Virou-se, com as últimas energias que lhe restara e encarou seu algoz.
— Por quêê??? - perguntou, com voz entrecortada.
— Porque eu me tornei mais forte que você - respondeu, Self - golpeando-a novamente.
Algumas horas mais tarde, os corpos de ambos foram encontrados pelos familiares de Dimitri. Assim como, misteriosas pegadas na neve, em direção da região central da cidade.
Algumas horas mais tarde, os corpos de ambos foram encontrados pelos familiares de Dimitri. Assim como, misteriosas pegadas na neve, em direção da região central da cidade.

Instigante e lindo mais esse conto,Rosa! Linda leitura! bjs, ótimo fds! chica
ResponderExcluirO que é que divide,
ResponderExcluiressa linha divisória
o perfume que não tive
das tuas pétalas Rosa!
Não o deixa voar no vento,
nem nas nuvens passageiras
para não ficarem o esquecimento
como ficaram no passado brincadeiras!
Obrigado pela carinhosa visita,
bom fim de semana, um abraço.
Eduardo.
Olá, Rosa.
ResponderExcluirGrato, por ter enobrecido, o meu blogue com o teu comentário.
Muito. mas, muito grato mesmo.
Desejos de um fim de semana agradável.
que Deus nos proteja sempre e Sempre.
Abraços.
Das leituras que prendem nossa atenção *-*
ResponderExcluirRosa, obrigada pela visita no Bem-me-quer. Espero te ver lá mais vezes!!
Beijoo'o
flores-na-cabeca.blogspot.com
Olá Rosa,
ResponderExcluirUm conto envolvente e com um final surpreendente.
Você é muito criativa e sua escrita tem o condão de prender o leitor.
Adorei a leitura.
Ótimo final de semana.
Beijo.
Um texto realmente surpreendente!
ResponderExcluirBom domingo. Bj
Sempre uma surpresa que se lê avidamente...Interessante a visão do perigo que pode se abrigar dentro de qualquer pessoa.
ResponderExcluirUm abraço
O mistério permanece vivo em cada um de nós, em todos nós, nos nossos lugares, nas nossas cidades.
ResponderExcluirCadinho RoCo
Nossa, amei! Gosto desse tipo de narrativa , com suspense e foco diferenciado. Muito bom mesmo, Rosa. Parabéns ! Bjs.
ResponderExcluirOlá Rosa! Fiquei muito feliz com a tua visita, teu amável comentário e, principalmente, por teres te tornado seguidora do nosso humilde espaço. Isso somente aumenta a minha responsabilidade de melhorar tudo aquilo que crio e escrevo. Espero que voltes mais vezes, pois será sempre um prazer renovado. Eu, particularmente, aqui voltarei mais vezes, pois além de teres um espaço interessante e bastante aconchegante, já há algum tempo, me tornei teu seguidor, isso até quando permitires, é claro.
ResponderExcluirQuanto ao post, belíssimo conto. daqueles que prende o leitor do início ao fim, deixando-o surpreendido. Parabéns!
Beijos e uma ótima semana para ti e para os teus.
Furtado.
Achei o Conto genial, extremamente criativo que culmina com um final surpreendente.
ResponderExcluirBeijo.
OI ROSA!
ResponderExcluirUM SUSPENSE DE PRIMEIRA, ADOREI.
ABRÇS
http://zilanicelia.blogspot.com.br/
Olá, Rosa! Vim para trazer-te os votos de dias maravilhosos neste resto de semana.
ResponderExcluirOlá amiga Rosa,
ResponderExcluirDesejamos que passes um Natal muito feliz com muita saúde, amor e paz e que o ano de 2015 te traga muita felicidade e transforme os teus sonhos em realidade.
Seguindo a máxima “Ano Novo, Vida Nova”, informamos que o Farol vai sofrer algumas mudanças já a partir do próximo mês de Janeiro. Assim, aproveitamos para te convidar a participar no desafio com o qual em 2015 iniciaremos essa mudança.
Beijinhos e abraços dos amigos,
Argos, Tétis e Poseidón
¸.•°✿╯Basta dizer uma coisa: leitura super envolvente!
ResponderExcluirBom tempo do Advento!
Muita luz e muita paz!
Beijinhos.
✿╮
Oi, Rosa, como vai? Desejo um Feliz Natal, que 2015 traga muitas alegrias e realizações! Um abraço, tudo de bom!
ResponderExcluirRosa.
ResponderExcluirHoje venho te agradecer pela amizade de tantos anos que
nos uniu por uma amizade linda nada balançou nossa
amizade e sim só fez se fortalecer ao longo dos anos...
Obrigada por tudo e principalmente pelo carinho de sempre.
Feliz Natal.
Um novo ano de saúde paz e realização em todas as áreas da sua vida...
Um forte abraço e meu eterno carinho.
Olá, Rosa!
ResponderExcluirVim para deixar-te os meus votos de um Feliz Natal.
Abraço.
Passando para deixar-te os meus mais sinceros votos de um Ano Novo esplendoroso; repleto de alegria, saúde, realizações e muita paz regada à felicidade...
ResponderExcluirFoi um privilégio caminhar a seu lado no decorrer desse ano .
ResponderExcluirEstou passando na minha última visita de 2014 e
agradecida por um dia ter conhecido uma
pessoa tão maravilhosa como você.
Nunca terei como agradecer seu companheirismo
que fez você ser tão espacial para mim.
Que essa amizade compartilhada no percurso
de mais um ano seja a alavanca para prosseguir em mais um ano.
Desejo um ano novo de grandes conquistas sonhos que se realize paz e esperança .
Sem despedidas deixo um encontro marcado para compartilhar novos momentos...
Agradeço esse presente divino que tem o nome de amizade.
Feliz Ano Novo.
Até nosso próximo reencontro em 2015.
Beijos ternos e carinhosos.
Evanir.
PARA ROSA MATTOS E SUA FAMÍLIA,
ResponderExcluirDESEJO FELIZ ANO NOVO.
Para que tudo de bom na vida mais evolua!
nasce o sol todos os dias para a terra iluminar
de noite brilham no céu as estrelas e a Lua
para o recebermos a sorrir quando chegar!
O Ano Novo que aí vem seja melhor,
do que o Ano velho ficando para trás
venha ele carregado de carinho e amor
muita saúde, felicidade, alegria e paz!
Um beijo,
Eduardo.
Minha querida
ResponderExcluirQue o ano de 2015 seja pleno de amor e felicidade...de paz e fraternidade...repleto de realizações e de sonhos concretizados.
E mesmo se as mãos estiverem vazias...que a esperança seja um sorriso esperando pelo futuro e iluminando o caminho para que a vida seja um suave tapete de pétalas e todos os dias do Novo Ano se pintem com o azul de uma serena madrugada.
E obrigada pelo carinho e amizade que me aquece o coração e me dá alento para continuar a minha caminhada.
FELIZ ANO NOVO
Um beijinho
Sonhadora
ツ
ResponderExcluirFELIZ ANO NOVO ♫♬° ·.
HAPPY 2015!!!
ིه° ·.
❤ه° ·.
ResponderExcluirBom fim de semana!
Beijinhos.✿ه° ·.
✿✿⊱ه° ·.